Um dos objetivos do Projeto Petrechos de Pesca é remover as redes, linhas, anzóis, boias e cabos encontrados ao longo da costa do Parque Estadual Ilha Anchieta (PEIA). Esse material pode estar flutuando no mar, enterrado na areia ou preso entre os costões rochosos da ilha. Ao longo dessa série, nós vamos falar sobre alguns dos impactos desses petrechos, e como eles nos afetam para além da área do Parque.

A maior parte do fundo do mar é composta por areia. Muitos organismos, porém, precisam de um substrato bem mais firme para crescer, como rochas. Um exemplo são os corais, animais que se alimentam de matéria orgânica disponível na água. À medida que vão crescendo, algumas espécies de coral vão formando estruturas que se espalham pelo fundo e dão abrigo mais organismos: são os recifes de coral. Mas além de rochas, estruturas não naturais também podem servir de base para a adesão. E quando organismos aderem a substratos de forma indesejada, isso é chamado de bioincrustação.

A bioincrustação pode ocorrer em cascos de navio, em lixo jogado na água, e até em petrechos de pesca. Mesmo com aplicação de substâncias anti-incrustantes, toda superfície sólida no mar será eventualmente coberta por organismos. E quanto mais tempo na água, maior e mais complexa é a incrustação. Alguns dos problemas mais comuns são a perda da velocidade em embarcações, o bloqueio de tubulações aquáticas, e a competição por espaço em cultivos de marisco. No monitoramento da nossa equipe pelo PEIA, encontramos todo o tipo de petrecho com bioincrustação. Mas recentemente, duas ocorrências chamaram nossa atenção.

As fotos abaixo mostram uma rede e uma boia, ambas encontradas no PEIA, e associadas a três espécies de organismos incrustantes: o coral-sol do gênero Tubastrea (esquerda), o mexilhão-marrom Perna perna (direita) e a craca Megabalanus coccopoma (direita). Todos esses organismos são invasores, ou não nativos do Brasil. Isso significa que eles competem com a fauna local por espaço e alimento, muitas vezes prejudicando nossas espécies nativas. Em específico, o coral-sol é um organismo que altera profundamente a comunidade de fundo, diminuindo a cobertura de espécies endêmicas de coral. O fato do coral-sol ter sido encontrado associado a uma rede de pesca é um achado bem preocupante, porque mostra a rapidez com que essa espécie é capaz de crescer em um substrato de origem humana.

Um último ponto importante é que os petrechos de pesca podem também facilitar a dispersão dos organismos incrustantes. No caso de objetos flutuantes, como a boia, as correntes marinhas e o vento podem transportar as espécies por grandes distâncias. Já os objetos não flutuantes, como a rede, podem servir como pontos de adesão intermediária entre os ambientes. Dessa forma, ao facilitar a chegada, o crescimento e a propagação de espécies invasoras em nossas águas, os petrechos podem causar impactos tanto no nível local quanto regional. Mas ainda existem muitos outros problemas causados pela presença desses materiais no mar. Se quiser saber mais, nos vemos na próxima postagem!

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